quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Frio.

Estamos na época do Natal. E não só é a época do Natal como também é dia de Natal, o dia em que as tradições são passadas aos mais pequeninos, em que a meia noite é esperada ansiosamente por todos, em que no ar paira o aroma a rabanadas e filhozes, a farófias e aletria (no meu caso), a arroz doce e Bolo-Rei. Também o dia que deixou de ser a celebração do "Nascimento-de-Jesus" (apesar de parecer antiquado, é ao que se deve) e passou a ser "o-dia-em-que-por-motivo-algum-se-recebem-presentes-em-todo-o-mundo-não-interessa-porquê-mas-sim-quantas-são-este-ano"...
Este ano passo em casa, apenas com a minha mãe. As duas passamos o mesmo serão de todos os dias: sentadas no sofá a ver as novelas e filmes, e de vez em quando lá dizemos umas quantas babuseiras.
O aquecedor é a nossa companhia... Sempre á nossa frente, fornece-nos o calorzinho que nos faz sermos-lhe tão fiel, porque o frio lá fora não perdoa. Parece que sabe onde nos encontrar, e como se fazer-nos sentir desconfortáveis e com pouca vontade de sequer sairmos não chegasse, ainda entra por todo o buraquinho que deixemos descoberto em casa, e vem-nos roubar o calorzinho, a confortabilidade; a mim, a felicidade e bem-estar.
Entra pelas fechaduras das portas. Sinto-o a subir pelas costas quando passo pelo corredor. Quase que oiço a sua respiração quando me envolvo nos lençóis, e quando adormeço, acredito que entre por cada pequeno poro da minha pele, que inocentemente (faz-nos ele acreditar) seja inalado pela inspiração profunda de um sono tão ou mais profundo, e acredito também que tenha sido ele o culpado de toda frieza em mim. Toda esta incapacidade de demonstrar sentimentos, toda esta minha indiferença perante quem me é tanto, de mesmo todas as dores que tenho tinho neste coração frágil, e agora gélido, de toda esta impossibilidade de sentir saudade de alguém...
Não sou capaz. Não sou... É-me simplesmente indiferente. Hoje... Hoje é-me indiferente. Não sei explicar como foi que eu mudei tanto, como foi que eu, a pessoa que se preocupava, a pessoa que dizia que amava sem se importar em obter resposta ou não, a pessoa que abraçava em beijava não por ser um dia festivo (como o Natal) mas por ser um dia como outro qualquer, por estarmos vivos, hoje não se sente mais com vontade de o fazer; a pessoa que saltava e pulava e dava cambalhotas e se ria até não conseguir mais, hoje derrama as suas companheiras de longas noites, as companheiras que trazem consigo um fundo escuro, feio, triste, e que me causam estas dores no pequeno coração... Isso mesmo, no pequeno coração hoje frágil e gélido que em tempos era mais quente que o Verão e que quase saía do peito de tanta força; a pessoa que sabia o que era a saudade como se sabe a cor do cavalo branco de Napoleão, que não sabia descrevê-la por toda a força que ela tinha nela... Hoje não a descreve por nem sequer a sentir. Não sei como mudei tanto.
Mas talvez não seja tudo tão "negro". Talvez o Natal voltará a ser a tradição e o gosto relacionados com a familia, e não com o materialismo (e talvez eu possa deixar de monstar a árvore de Natal... Ou não), talvez o frio passe e nos deixe... Talvez vá pra longe, e me deixe sozinha, talvez como mereço... Talvez tudo isto seja uma fase passageira, e talvez eu volte a abraçar, a beijar quem me quer bem; talvez consiga voltar a dizer "gosto de ti" sem pensar na resposta, talvez até consiga dizer que te amo, com todos os dentes e o piercing que tenho na boca! Talvez o coração gélido se torne de manteiga outra vez, e talvez eu volte a sorrir por isso! Talvez eu volte a saber o gostinho da saudade... Ou talvez eu nunca o tenha perdido, simplesmente o tenha guardado na gavetinha do "iglo" no meu peito.

Talvez...

Talvez.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Uma noite

Chego a casa... São 20.00. Está um frio terrivel lá fora; o vento assobia nas janelas, as árvores abanam como se não houvesse amanhã, mas ao entrar em casa sinto-me... Em casa! Aquele cheirinho vindo da cozinha é inigualável!
Dou um beijo á minha mãe que está quentissima (e eu que estou gelada), pergunto-lhe como foi o seu dia, respondendo-me que igual a todos os outros (para não variar muito), e dirijo-me até ao meu quarto. Pouso as coisas na cadeira ao lado do guarda-roupa, dispo o casaco, deito-me na cama de barriga pra cima, de braços e pernas abertas e penso "Odeio as segundas-feiras!".
Volto á cozinha e ajudo a minha mãe na preparação do jantar. Hoje decidiu fazer bacalhau á Lagareiro (mais que delicioso) e só por isso tenho todo o gosto em ajudá-la. Ela pergunta-me como foi o meu dia, e apesar de ter sido terrivel porque odeio as segundas feiras, e porque há sempre clientes que me conseguem tirar do serio, digo-lhe que foi normal, que correu tudo bem, mas que estou mais feliz por estar em casa.
Depois do jantar, inicia-se mais um serão igual a todos os outros: eu vou lavar a loiça (óptima maneira de aquecer as mãos), enquanto ela liga o aquecedor e se enrosca no sofá. Depois sento-me ao seu lado, e ali ficamos, as duas alminhas cansadas depois de um dia de trabalho, enroscadas em mantas e cobertores e coladas ao aquecedor, a ver as telenovelas e séries que passam todos os dias, e que chegamos a apostar sobre quem vai matar quem a seguir, ou roubar, ou perseguir, ou enganar (as novelas, desculpem que o diga, estão-se a tornar demasiado repetitivas). Por vezes, uma ou outra se levanta para ir até ao computador ver e-mails ou simplesmente falar com alguem, mas nessa noite apenas ela foi... Eu não estava com paciência para conversas de Internet que consistem em «-olá, tudo bem? -sim, e contigo? -também». La uma vez por outra se extende mais um pouco e ainda se diz «-então novidades? -não há», mas por norma, são sempre menos interessantes. Além disso tinha-me chateado com ele (que aliás, começara a ser o "pão nosso de cada dia"), e queria evitar encontrá-lo ou falar com ele, porque sabia que as coisas iriam piorar, por isso, deixei-me ficar pelo quentinho, e pelo aconchego de um serão familiar. Nem no telefone me apetecia tocar...
Após o serão, o meu mau humor era tanto que nem com a Raquel me apeteceu falar (e nao tivesse sido o Bacalhauzinho, tinha-me logo deitado) e assim, disse-lhe que não podia falar porque estava acompanhada e que falaria com ela no dia seguinte (sim, menti, mas eu só minto por boas razões).
Chá na mesa de cabeceira, oculos na cabeça, livro na mão e deitada na cama estava eu. Decidi ler. Nem me lembro que livro era, sei que a minha mae o andava a ler na altura.
Mas depressa me fartei da leitura. Nem cabeça tinha para pensar no sentido das primeiras linhas que tinha lido.
E foi quando, no silêncio dos meus pensamentos, ou da falta deles, ouvi a chuva lá fora, a cair, suavemente, devagar, como se devagar caminhasse para fazer uma surpresa. E continuava... Suavemente, até que começou a cair com mais força, com cada vez mais força, e aí bem que surpreendeu. Esbocei um sorriso. Enrosquei-me nos meus lençóis polares, apaguei a luz, e deliciei-me com nada mais do que a chuva a cair lá fora, a comandar todo o espaço, todo o metro quadrado... Por segundos não me mexi, não respirei, não pensei, apenas ouvi a chuva. E foi quando vindo do mais profundo desejo veio a vontade de saborear este momento com ele, veio aquela vozinha que só eu oiço mandada do sub-consciente que dizia «como gostava que estivesses comigo, agora mesmo...».
Não resisti e mandei-lhe uma mensagem com isso mesmo; nada de palavras bonitas, nada de coisas melancolicas, nada de ser uma mensagem para o fazer chorar ou muito menos rir... Apenas uma mensagem com um desabafo. Uma mensagem onde descrito estava o maior desejo de uma rapariga que gosta de gostar das pessoas, mas que quando gosta a sério, é muito a sério; de uma rapariga que por vezes só pede um pouco mais de compreensão e/ou de paciencia; de uma rapariga que ama rir, mas que também sabe chorar (e se sei); uma rapariga que reconhece que não é perfeita, mas que também não o quer ser pra ninguem... Que apenas o ser especial já é demasiado importante. Uma rapariga que, como todos, é um ser humano, e como ser humano teve um desejo que sabia impossivel de concretizar, mas possivel de compreender... Pergunto-me se nessa noite fria, se nessa noite onde se resumiu todo um dia já passado, se nessa noite onde a chuva foi a minha conselheira compreendeste o meu desejo, se lhe deste a importância que pelo menos eu dei.